segunda-feira, 20 de abril de 2015

Uma experiência marcante.

Criei esse blog para registrar minhas experiências profissionais. Como a vida de técnico esportivo e professor de Educação Física é recheada diariamente de momentos e decisões importantes sobre relações, comportamento, intervenções e mudança de hábitos, o professor acaba deixando passar diversos momentos que, na minha visão, precisavam ser registrados. E assim o blog foi criado, mas mesmo assim, não registrei nem 10% das situações e aprendizados que aqui gostaria de ter registrado. 

Pois bem, volto ao blog porque vivi nesses últimos 6 meses a maior experiência profissional da minha vida. Eu que sempre sonhei em ser técnico de basquete, que iniciei meus trabalhos em 1999, descobri no meio desse caminho que seria muito difícil um dia chegar em um nível profissional e em competições maiores. Isso porque o mercado é fechadíssimo, existem poucas equipe no Brasil e porque também faço parte de um perfil não usual no mercado: Não fui um jogador de sucesso, decidi trabalhar fora do eixo Rio-São Paulo e apesar de treinar equipes adultas desde o início, sempre tentei não abrir mão de trabalhar com a base, e há um senso comum bizarro no Brasil de que quem trabalha com formação "não dá conta" do ambiente profissional. 

Em um país onde são poucas as oportunidades de crescimento nessa profissão e em se tratando de um mesmo país que mal forma os seus atletas, gastando dinheiro principalmente no alto rendimento, imagina o que se faz na formação de seus futuros técnicos? Ser técnico desportivo no Brasil e sonhar em se desenvolver profissionalmente é saber que terá de gastar dinheiro para viajar, fazer cursos, gastar com suas próprias equipes, e claro, terá de ter empregos paralelos para que possa "bancar" esse sonho pessoal de estar atuando no desporto profissional brasileiro.

E a experiência que vivi nestes últimos anos da minha vida com esporte foi muito marcante porque passamos por cada etapa de crescimento na qual deveríamos passar. Um projeto voltado para atender a comunidade e praticantes apaixonados pelo basquetebol, em 4 anos, conseguiu transformar-se em uma equipe competitiva no Distrito Federal. Diagnosticando a nossa cultura da não capacidade em desenvolver atletas em maior quantidade, me aproveitei de uma safra em Brasília que acabara de passar da idade sub-22 da principal equipe do Distrito Federal e caminhava para abandonar o esporte e dedicar seus esforços para recuperar o tempo perdido no trabalho e estudos. Foi preciso um tanto de conversa para mostrar que era possível eles caminharem com a prática esportiva lado a lado com seus estudos e trabalho, já que somos ensinados desde cedo que no Brasil, para ser bem sucedido como atleta é fundamental largar os estudos e não fazer mais nada (infelizmente já vi "técnicos profissionais" tendo essa conversa com seus atletas de base). Montada essa base de atletas que acabara de perceber que suas carreiras haviam chegado ao fim e que tentavam criar uma sobrevida, complementei a equipe com atletas da cidade, que nem possibilidade de disputar uma competição sub-22 tiveram, pois há pouco espaço para muitos interessados e o esporte sempre promove essas lacunas dentro do seu famoso "funil" de aperfeiçoamento. 

Campeão do DF em 2013. Título que nos possibilitou alçar novos voos. 

O que nos restava era treinar. Treinamos nos horários possíveis, tentando dar o nosso melhor. E esse melhor nos levou ao título de campeão adulto do Distrito Federal. Algo que para nós fazia sentido pelo tanto que trabalhamos, mesmo que surpreendesse alguns outros. Automaticamente estávamos classificados para a Copa Centro-Oeste no ano seguinte. Como disputar algo em maior nível com a estrutura que temos tão simples e baseada no esforço de cada um? Recebemos então um apoio da instituição que representávamos. Ainda meio que sem saber como era isso e de que equipe se tratava, o UniCEUB, instituição na qual trabalho há 9 anos e que possui uma equipe multicampeã na modalidade, resolveu dar as condições básicas para que pudéssemos viajar, e disputar a competição com maior qualidade. Além disso, graças ao apoio, conseguimos trazer dois jogadores contratados para nos dar mais experiência a um grupo que de repente, começava a almejar coisas maiores. E vencemos mais uma competição. O campeão da Copa Centro-Oeste estava automaticamente classificado para a Supercopa Brasil(que corresponde como uma terceira divisão nacional) um mês depois. E com muito trabalho e abnegação de todos os envolvidos, um mês depois, éramos campeões da Supercopa Brasil, algo que nem nos meus melhores sonhos anos atrás eu imaginava chegar por este caminho. Com essa grande conquista para nosso nível, um novo desafio: Estávamos classificados para a Liga Ouro, divisão de acesso ao NBB. Bastava agora correr atrás de investidores que nos garantissem o mínimo de investimento exigido pela Liga Nacional de Basquete. E atrás fomos. 

Foto: Clas Mendes
Dessa vez, o UniCEUB deveria investir de maneira efetiva na equipe. E depois de alguns meses de negociação e muito aprendizado sobre os bastidores de como formar uma equipe profissional, surgia o Basquete CEUB, a profissionalização de uma equipe que surgira em 2010 para apenas atender comunidade que era apaixonada por basquete no Distrito Federal. A partir daí, foram 6 meses de viver apenas para isso, todos os dias, horas e minutos passados, tentando montar um formato mais próximo possível do profissional. Tentei usar tudo que já li e estudei sobre esporte, tudo que um técnico estuda e que nem sempre sabe se vai usar um dia, pois no Brasil não há planos de carreira para técnicos, não há garantia de crescimento e posso dizer que foram 6 meses de tentar transformar muitas teorias em práticas. Tudo o que também estudei em gestão de pessoas, para gerir o projeto, montar equipe não só de atletas, mas de profissionais ao meu redor para que o trabalho não fosse apenas dar treino, mas sim de se consolidar uma equipe com estrutura: física, de recursos humanos e de ações que integrassem a equipe, tanto em treinamentos, quantos em divulgação em redes sociais e em ofertar aos atletas uma estrutura básica para que pudessem se preocupar apenas em treinar com qualidade e se dedicarem ao máximo. Isso é o que eu acredito e foi o que tentei e tentarei sempre fazer. Há muitas correntes no esporte amador-profissional que se preocupa apenas em pagar salários e deixar com que os jogadores resolvam o resto e tragam títulos. Eu acredito que o ambiente esportivo é muito mais do que isso e diversas áreas precisam ser cuidadas. 

Foto: Clas Mendes
Foram 6 meses de trabalho intenso, de todos. E hoje, olhando pra trás, já com mais sabedoria do que emoção, percebo que tudo isso não foi capaz de levar nossa equipe a um nível mais competitivo. Não nos classificamos aos playoffs, vencemos poucos jogos e perdemos alguns que poderiam mudar nosso destino na competição. Pensando em esporte, totalmente normal esse acontecimento. Sempre haverá uma equipe campeã e também sempre haverá aquela equipe que não alcançou seu objetivo. Mas não dá pra achar isso normal quando a chance que se tem aparece na sua frente com traços de ser única. Em um país onde não se entende e não se discute de esporte profundamente, onde nossas avaliações são baseadas no senso comum do telejornal esportivo da hora do almoço, uma chance dessas é a chance de mostrar que é capaz, de que chegou a sua hora e de que você pode ter mais chances nesse meio. Mas não foi onde consegui chegar. Não consegui dar o resultado que gostaria à minha instituição. E trabalhei sempre pensando e acreditando que esse resultado era possível. Certamente a maior derrota da minha vida até agora. E hoje, olhando com calma e tentando entender que esses aprendizados não podem ser desperdiçados, percebo que errei no trabalho. Errei no direcionamento dado a ele e isso me custou a chance de disputar um playoff que por tantos dias fui deitar pensando nele. Como disse antes, agora conseguindo enxergar com a razão, até me empolgo em falar dessas falhas, pois sei que tenho condições de evoluir e que pra chegar onde cheguei, perdi muitos jogos e decisões importantes que naquela época foram "a maior derrota da minha vida". Logo, passado a tristeza pelo não êxito, me preparo para buscar mais do meu trabalho, para continuar indo além do que posso e para já colocar os aprendizados desses últimos seis meses em prática. Estudo esse esporte e suas variáveis todos os dias e sei que a tendência a cada erro meu é de melhorar e aprender, pois dentro da minha prática profissional não me acomodo com os conhecimentos adquiridos. Como diz uma frase que gosto muito do matemático e Prêmio Nobel, John Nash: 

"A cada fracasso meu, aumentam minhas chances de ser bem sucedido."

Foto: Clas Mendes
Mas vim aqui neste blog registrar esse trabalho de cinco anos de forma bem resumida por três grandes motivos. O primeiro de todos é de deixar claro que de uma certa forma e pensando estritamente no resultado, fracassei. Errei e por se tratar de um trabalho relacionado ao esporte, onde a tentativa, acerto e erro fazem parte do dia a dia de quem está no meio, errei e paguei com os resultados dentro de quadra. É importante deixar isso claro, pois não sou daquele tipo de técnico que quando perde procura explicar seus erros nos erros de arbitragem, nas lesões ocorridas durante o processo da competição ou no lento processo de entrosamento na montagem de uma nova equipe. Tenho certeza de que errei muito mais do que os árbitros possam ter errado em meus jogos. As lesões atrapalharam, mas todo técnico que se preze e que não refute suas responsabilidades sabe que lesões fazem parte do planejamento inicial e por isso não se monta uma equipe com 6 ou 7 atletas apenas e sim, um grupo bem maior (Existem "técnicos profissionais" que declaram que no basquete só se joga com 8 jogadores). E por fim, o entrosamento que custou a acontecer deveria ter sido melhor previsto por nós nos treinamentos e esse também foi um fator que atrapalhou todas as outras equipes por se tratar de uma competição de curta duração onde todas as equipes envolvidas estavam em formação. Por isso não posso em momento algum apontar para algum lado para explicar derrotas. Pois apontar para fora em um trabalho como esse, seria não me dar a chance de aprender e melhorar como profissional nos erros que foram cometidos de dentro. 

Em segundo lugar faço esse enorme, porém resumido post, para agradecer. Agradecer o imenso número de pessoas que torceram e contribuíram de alguma forma pelo crescimento deste projeto. Primeiramente aos três diretores do UniCEUB, que mesmo tendo uma equipe profissional em mãos resolveram apostar em profissionais pratas da casa a ir atrás de fazer um projeto enraizado na instituição crescer deste tamanho. Ao Dr. João Lopes Filho, ao Dr. Geraldo Rabelo e ao Dr. Homero Neto, minha gratidão pela confiança, entusiasmo e investimento do UniCEUB em nosso trabalho. Aos meus familiares por aceitarem minha ausência em troca de ir atrás de um sonho de criança, e aos meus amigos, colegas de trabalho e de paixão pelo mesmo esporte, que se sentiram representados vendo uma equipe criada na cidade, com atletas crescidos na cidade tentando representar o basquete da sua região pautados por um trabalho sério, comprometido, dedicado, mas que infelizmente por enquanto não foi o suficiente para levar àqueles que se sentiram representados mais adiante. 


E em terceiro lugar, resta o imenso agradecimento aos profissionais envolvidos diretamente no projeto. Atletas, comissão técnica, prestadores de serviços e estagiários. À todos vocês agradeço por terem se mantido juntos, intactos, dignos e por terem tentado dar o seu melhor até o nosso último segundo de jogo. Acredito que quando se faz algo de forma limpa, íntegra e com total dedicação, a chance de evoluir é grande, mas não garantida. Para isso, é preciso continuar seguindo firme enfrentando os próximos desafios. É nisso que penso agora e é isso que estou praticando desde nossa eliminação.


Vamos em busca de novos desafios, pois são eles que nos dão a chance de continuarmos crescendo. 

Grande abraço a todos e até a próxima!



sexta-feira, 7 de março de 2014

O Luxo e o Lixo

Sou de família carioca que é intimamente ligada ao samba. Desde garoto acompanho os desfiles das escolas de samba e durante todos esses anos, apesar de atualmente não acompanhar mais da mesma maneira como antigamente, cultivo admiração por samba, pelos desfiles e sempre que vou ao Rio é uma tradição ir aos ensaios das escolas pra matar a saudade. 

Faço essa introdução pra dizer que no carnaval deste ano completou 25 anos do desfile antológico da Beija-Flor, que tinha como seu carnavalesco o lendário Joãosinho Trinta, que veio com o enredo "Ratos e urubus, larguem minha fantasia" Este enredo foi uma resposta de Joãosinho Trinta para todos que o criticavam por ele só trabalhar de maneira luxuosa. Pois bem, Joãosinho produziu um tema que falava sobre o lixo. Começou falando do lixo físico e durante o desfile foi abordando outros tipos de lixo: o lixo moral, mental e espiritual, podendo aí enfatizar toda a sua crítica social no enredo. Em sua sinopse que fora entregue aos jurados, Joãosinho Trinta falava de um Brasil de contrastes, que ao mesmo tempo em que tem a beleza e riqueza do nosso país, tendo o desenho geográfico se assemelhando a um coração, é também um país que se desequilibra e que quando vira de cabeça para baixo o desenho geográfico se assemelha a uma bunda, no qual seus excrementos precisariam ser lavados. Esses excrementos então seriam representados na ideia de dejeto, sujeira e lixo, em diversos sentidos. 

   Desfile da Beija-Flor de 1989. Horas antes do desfile a Igreja conseguiu proibir na justiça a imagem do carro abre alas que mostrava um Cristo mendigo. Foi aí que Joãosinho Trinta improvisou com uma lona preta e esta mensagem.

Pois bem, lembrando desse desfile que consagrou-se como um dos mais belos e revolucionários desfiles da história das escolas de samba do Rio, venho aqui tentar falar de esporte. 


E qual paralelo posso fazer?


Nesses tempos de mega eventos no Brasil e de um discurso de que o nosso país vai trabalhando (vai mesmo?) para se tornar uma potência olímpica, fica fácil traçar um paralelo com a ideia de Joãosinho Trinta. Hoje, no esporte, talvez seja a época em que mais conseguimos visualizar o contraste luxo e lixo. Estamos acompanhando a construção e reformas de estádios tornando-os luxuosos palcos para realização da copa, vemos grandes atletas brasileiros com patrocinadores fortes (apenas quando já chegaram no topo e apenas dos esportes mais populares ou televisionados), estampando propagandas e disputando grandes competições, mas por outro lado vemos o gasto desenfreado de verba pública na construção de grandes estádios de futebol, algumas obras de revitalização das cidades que ficarão prontas (será?) apenas após a realização da competição, gastos, gastos, e mais gastos na infra estrutura física. Em relação aos atletas, se os já consagrados recebem apoio, como estão os atletas em formação, que sonham diariamente em defender seu país em seu esporte, treinam horas e mais horas e não possuem uma estrutura básica para seu treinamento? 

Em um país que tem leis e impostos que, no papel, deveriam servir para alimentar seu próprio desenvolvimento, o que pensar quando surge um projeto que está perto de ser consumado onde pretendem anistiar cerca de 2,8 bilhões de reais de dívidas de 100 clubes de futebol? 

Como acreditar em um ministério que deveria desenvolver o esporte brasileiro e que virou essencialmente uma moeda de troca de apoio ou de marketing político e que não tem como prioridade colocar pessoas que realmente estudam o esporte, que entendem de formação esportiva. Um ministério que não prioriza seu maior investimento na base e sim no topo da pirâmide, em troca de propaganda para o próprio governo se valendo de resultados efêmeros, pois se não há base, provavelmente não haverá continuidade.

Título histórico do Handebol Feminino. Atletas tiveram que sair do Brasil pra conseguir sobreviver na modalidade.  E a base desse esporte? Como andam os investimentos para que este trabalho não se perca após 2016?

Vemos assim a prática do que disse o carnavalesco, que foi inspiração pra esse post, assim que terminou seu desfile em 1989: "É o luxo do lixo e o lixo do luxo." Enquanto no "lixo" estão professores, pais, abnegados pelo esporte, atletas se virando pra tentar chegar em uma performance de alto nível mesmo sem a estrutura necessária, abrindo mão de seus estudos e sua vida, temos no "luxo" a politicagem, a corrupção,  interesses pessoais acima do interesse comum em desenvolver a longo prazo e a despreocupação com o real legado que a formação esportiva poderia oferecer que seria a de formar atletas, mas formar pessoas acima de tudo.

Atualmente já não sei o que pensar ou sentir. Se me revolto com todo esse contraste ou me preocupo em lutar para fazer meu trabalho e não me deixar contaminar por todo esse lixo histórico. Histórico porque percebo que faz parte da nossa cultura tratar com desleixo o dinheiro público, a aceitação da impunidade, o conformismo com os desmandos políticos, e tantas outras mazelas como apenas características de um país que vive em eterno contraste.

Para nós, brasileiros, a cultura nos diz que o esporte é "mágico", onde acredita-se que só é talentoso e brilha quem nasceu com um dom. Onde não há planejamento, visão estratégica e trabalho de formação visando o desenvolvimento também da educação. Dessa forma resta-nos torcermos para que possamos caminhar evoluindo e que esse ano possamos olhar o esporte brasileiro e seu desenvolvimento muito além da realização da copa do mundo.

Penso que Joãozinho Trinta, se ainda fosse vivo e recebesse um convite pra criar um enredo com o tema "O esporte brasileiro", talvez de imediato estranhasse e nos dissesse: Já fiz esse enredo há 25 anos atrás.
Mas caso ele topasse o desafio e lembrando como ele gostava de provocar, imagino no desfile, aceito por João, um pesado carro alegórico com cópias dos 12 estádios reformados, sobre eles estariam em destaque os políticos, sorridentes e orgulhosos por suas grandes realizações. No chão, empurrando o carro um povo cansado, com camisetas de propagandas das bolsas família, educação, etc. À frente do carro alguns atletas de base, sofridos e sonhadores, empunhando uma faixa negra com letras brancas:

"Mesmo com tudo errado, torçam por nós!"


E por falar em crenças e cultura, como oficialmente acabou o carnaval... Feliz Ano Novo para todos nós!


Até a próxima.





terça-feira, 15 de outubro de 2013

Acima de tudo, PROFESSOR!

Parabéns a todos os Professores!


Peraí!!! Será? Será que o parabéns é a todos?
Se houvesse um dia dos políticos? 


Você se arriscaria dando os parabéns a todos, ou àqueles que tentam honrar a profissão?
Pois bem.. faço o mesmo por aqui!

Dar aula precisa ser uma questão de opção e não uma questão de sobrevivência. 


Parabéns aos Professores que mesmo sobrevivendo a um sistema em que desvaloriza a profissão, ainda conseguem se desdobrar e encantar seus alunos e não explica suas dificuldades ou usa desse mesmo sistema pra dizer o porquê que não dá aula direito. 

Parabéns aos Professores que acordam motivados em fazer a diferença em suas aulas, mesmo sabendo que na noite anterior dormiram pouco, planejando suas aulas e fazendo ajustes finais, muitas vezes chegando a abrir mão de sua vida pessoal, porque a sua vida pessoal também é ser Professor. 

Parabéns aos Professores que trabalham duro e que ainda ouvem dizer que a vida é moleza pra quem dá aula porque têm duas férias no ano. Parabéns aos Professores que depois de tanto trabalho e entrega ainda ouvem a pergunta se você trabalha ou se só dá aula mesmo. 

Parabéns aos Professores que se dão a chance de educar-se enquanto educam, pois educação é uma via de mão dupla, mas cheia de curvas sinuosas que passam perto de abismos chamados de soberba, prepotência e ilusão de que se sabe mais do que alguém.

Parabéns aos Professores que têm certeza de que as pessoas não aprendem na mesma velocidade, e que por esse mesmo motivo conseguem adequar suas falas e intervenções, no intuito de desenvolver os mais diversos potenciais existentes, mesmo sabendo que o sistema estimula o pensamento contrário, fazendo da diferença uma oportunidade para comparar, classificar, aprovar e reprovar. 

Parabéns aos Professores que pensam de forma multidisciplinar, que sabem que sua área de conhecimento não é a única "fonte de vida" e que possuem a humildade de dizer não sei quando questionados por algo que não domine naquele exato momento, pois ser Professor não é saber de tudo, e sim saber ser um facilitador da aprendizagem e um provocador à descoberta e ao conhecimento.

Parabéns aos Professores que conseguem ver em outro Professor a chance de se renovar e uma possibilidade de aprender e que fazem das parcerias nos corredores entre salas, mais um momento de aprendizado, mais uma chance de melhorar seu trabalho. 

Parabéns aos Professores que sabem que ter carisma é essencial para dar aula, mas que não é tudo. Que estudar, oferecer conhecimento de qualidade e estimular o pensamento crítico são o maior carisma que se pode oferecer aos seus alunos. E que no fim das contas, anos depois, sendo você engraçado, divertido, dócil, duro ou ranzinza, o que fica de lembrança é de alguém que te estimulou a pensar e a descobrir seu caminho por si mesmo.   

Parabéns aos Professores que enxergam sentido no que fazem e que, por acreditar em dias melhores, lutam diariamente para que estes dias aconteçam e para que o sentido que dão a suas aulas possa fazer sentido a outros tantos. 

E aos Professores de Educação Física em especial, fica a dica.. Que seu dia é 15 de Outubro. Porque independente de onde você atue, seja na escola, no ginásio, na piscina, no tatame, na academia, ao ar livre ou em qualquer outro lugar que seja, você acima de tudo é um Professor, que precisa entender de gente, de pedagogia e que precisa saber adequar suas ideias a uma formação coletiva.

Fica aqui os parabéns a uma classe nobre na qual tenho o imenso orgulho de fazer parte, onde muitos me ensinaram, me inspiraram e inspiram até hoje a buscar ser um profissional e pessoa melhor. É a profissão que escolhi  e que quando me perguntam o que faço da vida, posso falar com convicção e  de peito aberto:

Sou Professor! 

quarta-feira, 25 de setembro de 2013

Qual é o seu talento?

Tenho uma grande amiga escritora chamada Aline Valek. Desde que a conheci e comecei a conviver com ela, sempre foi uma fonte de inspiração absurda. Vejo que apesar de achá-la talentosa e extremamente competente na arte de construir textos de forma envolvente e provocante, percebi que todo esse processo de esforço, nada mais é do que muita dedicação e horas de TBC - Tempo de Bunda na Cadeira (aprendi esse termo recentemente com um professor e resolvi adotá-lo).

E recentemente ela escreveu um post em seu site (no qual recomendo muitíssimo a leitura) que falava de forma provocativa que ela não acreditava em talento (você pode conferir este post aqui) e que não se identificava com a ideia "mística" que damos a quem "leva jeito" para algo. Como se além de uma predisposição (ou não), não houvesse também ali horas de dedicação para se chegar a um nível de excelência.

Como de costume em seu site, Aline conseguiu provocar diversos leitores que começaram a comentar em sua página no facebook (também vale conferir, aqui) falando sobre a predisposição genética que as pessoas podem ter. Até aí tudo bem, também acredito nisso e a própria Aline fez um adendo no post falando sobre isso e reconhecendo esta questão sem deixar de enfatizar que a prática, essa sim, te leva a uma qualidade próxima de você poder ser chamado de talentoso. No vídeo abaixo faço a seguinte pergunta: São todos apenas talentosos ou associaram talento à uma prática constante para chegarem nesse nível?



Mas o que mais me impressionou foram alguns comentários que denunciam algo que vejo diariamente na Educação Física e no trato com esportes. Dois comentários em especial me chamaram muito a atenção. Uma dizia que talento existe sim e dava o exemplo do cantar. Que ela nunca, de maneira alguma, mesmo que treinasse durante anos, ela conseguiria cantar como a Whitney Houston. E em outro comentário um rapaz falava a favor da "loteria genética" e dizia que não dava para esperar que um anão fosse o melhor jogador de basquete do mundo.

Vocês conseguem perceber do que esses dois comentários falam? Eles falam de padrões que saem da busca pessoal. Em um primeiro momento a moça que cita a Whitney Houston como padrão, desconsidera qualquer evolução pessoal que ela pudesse ter com sua dedicação, pois nunca chegaria a ser como sua referência musical, no caso a Whitney. E o outro, simplesmente nega que um anão possa ter acesso à prática de uma modalidade, pois ele já está descartado de ser o melhor do mundo. Como se para praticar esporte, uma das principais válvulas motivadoras fosse ser o melhor do mundo e caso isso não fosse possível de ponto de partida, não seria então motivador ou não teria propósito, como se fosse perda de tempo.

O que vejo nessas duas falas me faz arriscar a dizer que são produtos de um forte e impregnado senso comum que habita o imaginário coletivo. Senso comum baseado numa cultura que prega que fazer o que te dar prazer não tem sentido caso você não se destaque.

É claro que preocupar-se e querer destacar-se é mais do que que aceitável e humano até. Quando começamos a aprender algo, uma das molas propulsoras que mais no mantém conectado com o aprendizado é a chance de ficar melhor (mais habilidoso) em tal atividade. Mas dizer que a única possibilidade de desenvolvimento é a de ser top, melhor do que todos os outros, é realmente grave e é o que mais vejo de preocupante em minhas aulas. É muito comum receber alunos novos com o discurso de que não levam jeito para determinada atividade. Eu sempre tento levá-lo a pensar que se ele acredita que não leva jeito para tal coisa, talvez seja esta atividade a indicada para ele praticar, já que terá a chance de evoluir, desenvolver, aprender. Claro, desde que seja uma atividade em que ele veja sentido, possibilidades e se envolva por interesse próprio.


Mas o que vemos por aí não atinge esse campo. São pais dizendo aos seus filhos ainda quando criança que precisam conquistar melhor nota da sala (e desde quando a nota garante a você sucesso absoluto?), que quando pintam um sapo de vermelho está errado, pois sapo é verde e assim você não vai chegar a lugar algum. E assim vamos passando a ideia de que nos desenvolvemos apenas para ser o melhor. E por isso existem tantas frustrações hoje em dia. Tanta gente achando que falhou porque acreditou que sua referência estava fora de si mesmo, em padrões ditos a ele, visto na tv ou que nos fazem acreditar no dia a dia, quando o que deveria se preocupar era de fazer o melhor que pode, o tempo todo. E dessa forma, se avaliar, reavaliar e cada vez mais descobrir seus potenciais, limites e ir se aventurando nesse mundo de possibilidades que a vida nos oferece.

Acreditar que o "topo" está reservado apenas para os "habilidosos natos" é uma forma de se sabotar e explicar nos outros muitas vezes o que não se permitiu ou o que não se tentou fazer. Há espaço para todos, em diversos níveis, desde que o foco seja a própria evolução, ser melhor do que já foi um dia. Nos 15 anos que trabalho com iniciação de basquete, poucos atletas com que trabalhei tiveram a chance de se tornarem profissionais, considerado o topo da modalidade. Mas tenho uma alegria de saber que muitos em sua grande maioria levaram os aprendizados para seus níveis e conseguiram praticar a modalidade onde melhor se adequaram: Seja numa equipe de alto rendimento, seja jogando campeonatos da escola, na universidade, seja um praticante consciente do jogo pra apenas bater aquela pelada com os amigos. O que quero dizer aqui é que o aprendizado fica, te acrescenta, te faz evoluir e saber que muitas das habilidades que temos são frutos de esforço, repetição e reflexão sobre o que e como estamos fazendo, é se dar a chance de se conhecer melhor e assim, aprender que você pode adquirir novas habilidades, baseadas nas suas qualidades, nas suas limitações, mas que você é capaz de desenvolver-se.

É triste as vezes ouvir ex atletas ou pais de atletas dizerem que o filho se dedicou tanto para nada. Como se houvesse apenas um único fim em nossos propósitos. Posso não levar jeito para ser uma estrela do rock, mas posso tomar vergonha na cara(deveria pelo menos, ainda tenho esperança!) de fazer aula de guitarra e tocar as músicas que mais gosto.

Pare pra pensar em como muitas vezes você deixa de vivenciar algo novo, pois explicar que nunca levou jeito para tal coisa. Hoje em dia nas empresas estamos vivendo uma era em que as pessoas não podem mais ficar estacionadas em seu setor e na sua "caixinha" de conhecimento pra sempre. Muitas vezes é mais valorizado aquele que tem a capacidade de reciclar-se, reinventar-se e redescobrir-se (algo sobre isso aqui). Essas lições podem ser facilmente aprendidas no esporte quando garoto. Eu pelo menos tenho tentado mostrar isso aos meus alunos. Que os aprendizados tidos ali na quadra, podem ir para muito além dela. E que talento só terá sentido se for associado à muita prática.



Quando vemos um vídeo como esse acima, de uma cara considerado gênio pela maioria e descobrimos em seu discurso que ele se aproveitou das oportunidades que teve para "construir seu talento", acho sinceramente que devemos começar a pensar qual o talento que estamos construindo para nós mesmos.

Certamente vale a reflexão.

Abraço a todos!




segunda-feira, 2 de setembro de 2013

Mais um 1º de Setembro.

Mais um dia 1º de Setembro passou (Dia do profissional de Educação Física). 

E como sempre faço neste espaço, aproveito para reforçar a minha opinião de que o nosso dia mesmo é dia 15 de Outubro (Dia do Professor), mas que é sempre bom ser lembrado como aconteceu ontem, mesmo sabendo que esta data comemorativa é fruto de uma luta política para um conselho se legitimar como "dono" dos "direitos de imagem" dos professores de educação física. Mas enfim... Sempre recebo os desejos de felicitações com carinho e de maneira agradecida. 


Nestes últimos dois anos tenho participado de cursos de formação de professores, seja como convidado em universidade, onde estão se formando futuros professores, sejam em cursos de reciclagem, onde me encontro diante de professores já formados, interessados em ressignificar seus estudos, conhecimentos, e questionar as práticas descontextualizadas que existem por aí em nosso meio, e tenho convivido com estagiários onde trabalho, querendo dar aulas interessantes, estimulantes, em busca de educar e de deixar alguma formação como legado. 

Curso de formação continuada dos professores de educação física da rede pública do DF.

O que tenho visto disso tudo é que existe muita gente interessada em ensinar diferente. Em não fazer parte do "show de horrores" que acontece em muita escola, em muito centro de treinamento. Existe muita coisa errada em nosso meio, mas percebo também que existem pessoas afim de se livrar do discurso diminuto que o esporte diminui a violência, que a aula é divertida e que quem não quer fazer aula "não quer nada". Uma aula de educação física é muito mais que isso. Respondemos hoje em dia pela cultura impregnada em nosso meio de que esporte é só uma diversão, de que formação motora está muito abaixo da formação cognitiva e de que não há ligação entre elas. Pagamos caro o preço da nossa imagem, de nossos professores/mestres/doutores que muitas vezes fizeram de seus títulos acadêmicos, uma oportunidade para trabalhar menos, buscar estabilidade profissional e financeira e formar mal os futuros professores da área. 

Mesmo assim, mesmo com a realidade onde o professor de educação física na escola tem a função de entreter a garotada e não deixá-las se machucarem, mesmo sabendo que o senso comum diz que o professor de esportes trabalha apenas com a formação motora de seus alunos e que professor bom é professor divertido. Mesmo com a visão reducionista sobre nossa profissão, vejo muita gente boa por aí querendo fazer diferente. Tenho convivido com muitos destes e este simples fato de estar ao lado de jovens que querem mais da área e poder conhecer professores com anos de "cadeira" ainda se dando a chance de questionar seus métodos e seu trabalho é que acredito que devemos dividir mais conhecimento. 


E por isso este blog não serve mais para o que me propus de início que era compartilhar experiências. Este espaço é pequeno para o tanto de gente que tenho visto que tem sede por buscar mais informações. E é inspirado nessas pessoas que digo que este espaço está com data para encerrar. A partir de outubro, nos tornaremos um site, com mais ferramentas, pessoas envolvidas querendo compartilhar experiências e com a possibilidade de influenciar e ser influenciado por muito mais pessoas.

Tudo isso porque vemos a necessidade de se discutir a área. Vivemos num país que se discute pouco Educação Física, se divide pouco conhecimento e que recentemente tem tido um problema grave na formação de novos profissionais. Fica o convite para você participar e acompanhar nosso novo site. Digo nosso, pois será meu, seu e de todos interessados em colaborar.

Em breve..

Por enquanto, vamos lembrando que o dia do professor de educação física é todo dia em que uma aula se inicia e que em suas mãos está a responsabilidade de mostrar que a formação se dá muito além dos livros, das práticas e dos jogos.

Abraço a todos!

quarta-feira, 6 de março de 2013

Muito além de um filme.

Tenho criado o compromisso aqui neste blog de quando puder, falar de assuntos e mostrar situações que não são favoráveis ao esporte, à educação, à formação esportiva de qualidade e tudo que possa estar atualmente distorcido sendo tratado como normal. E ontem me deparei com um filme que fala muito sobre isso. Fui presenteado ontem por um colega com um filme. Ia salvá-lo pra ver outro dia, pois já era tarde. Resolvi então só ver os primeiros minutos pra ter uma ideia e não consegui parar. O filme tratava de uma denuncia de uma cultura absurda que hoje em dia é tratada como natural em nosso País. 

O filme trata sobre o consumo de alimentos não saudáveis e como isso tem impactado diretamente as nossas crianças hoje em dia. Mas ao assistir o filme, fica nítido que não se fala apenas de alimentos que hoje em dia são gordurosos demais e que contém açúcar em demasia.

O filme trata da triste realidade de diversos atores que colaboram pra que essa comida seja valorizada. Toca no assunto da educação física que inexiste para educar o aluno hoje em dia. A educação física que apenas é um componente curricular para passar tempo nas escolas e aliviá-lo entre um horário e outro de estudo. Onde as crianças são analfabetas motoras e a brincadeira, o jogo, o esporte, são práticas cansativas nos dias de hoje. O filme mostra a incapacidade que os pais têm de conversar com seus filhos ou de não realizar seus desejos a todo momento. Fala da correria que a vida impõe a esses pais e como eles perdem a capacidade de acompanhar a educação e formação de seus filhos. O filme fala da relação absurda que a tv tem com as crianças. Nos dias de hoje os pais se confortam em ter uma tv por perto para a criança ficar "quieta" e não dar muito trabalho, já que o dia tem sido corrido e cansativo. E essa mesma tv que "acalma" e entrete a criança, é responsável por incutir valores distorcidos da realidade e formam pequenos consumidores cegos a um estilo de vida mais saudável. 

O que se vê nesse filme dificilmente está na tv, não passa nas propagandas, e raramente se vê de forma tão enfática nos telejornais. Ao ver o filme, sente-se uma tristeza por descobrir que cada um de nós é um pouco do que se mostra ali. É um reprodutor de uma cultura que pela primeira vez depois de muito tempo está criando uma geração de crianças com menor expectativa de vida do que a nossa. 

O nome "Muito além do peso" para o filme é realmente perfeito, pois mostra que chegamos a esta condição por muitos fatores. Por abrir mão das decisões em nossas vidas e entregá-las aos publicitários e suas propagandas que reforçam estilos, modas, marcas e costumes, e por nos tornarmos consumidores acríticos e sem limites.

Tire um tempinho do seu dia e assista com sua família. Desligue a tv, deixe de assistir um dia a novela ou o big brother, junte as pessoas na sua casa e assista. Vale a pena parar e refletir sobre o estilo de vida que estamos seguindo e questionar um pouco sobre o que estamos recebendo de informação da tv.

Aproveite o filme:


sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013

Qual é a sua grandeza?

Abro o ano de 2013 aqui no blog, dividindo com vocês uma propaganda da Nike, que considero provocativa. Na verdade sou suspeito pra falar, pois costumo gostar bastante dessas propagandas de internet produzidas pela Nike. Gosto das imagens que eles selecionam e principalmente dos textos que são colocados sempre com uma boa narrativa.

Nesta propaganda, o narrador questiona a ideia de que nascemos com dom. A ideia de que nascemos prontos com nossos talentos e acreditamos que somos especiais. Ele brinca com a própria ideia de uma expressão muito usada por aqui de que "Deus é Brasileiro". E vai além: Diz que pensar dessa forma, que somos especiais, que estamos prontos é que nos acomoda, que nos faz ficar onde estamos e quem sabe sabote a nossa capacidade de crescer, evoluir, desafiar-se entre tantas outras possibilidades.

Ao invés de eu ficar aqui falando sobre o que acho da propaganda, melhor é dividir com vocês, não?

Segue o comercial:


Pois bem, tentando ficar alheio às intenções mercadológicas da propaganda, tentando extrair do vídeo o que há de bom para se refletir e após assistir algumas vezes essa propaganda, pensei em diversas questões que vivo ao trabalhar com esporte. É muito comum ao se tratar da prática esportiva, criar um maniqueísmo onde só existem dois lados: Sei jogar ou não sirvo para esporte ("E aí, Professor? Ele leva jeito ou não?"). Começo e pensar então em quantos alunos vêm com o discurso de que não sabem jogar ou não levam jeito e com o tempo de treino, resistem a aprender novos movimentos, situações de jogo, mas com o decorrer da prática, aprendizado e do esforço próprio, se transformam em outra pessoa?  

Quando comecei a pensar assim, minha mente foi longe e comecei a pensar realmente sobre as situações e realidades que me afligem ao trabalhar com esporte. Comecei pensando e questionando qual era a grandeza que existia no Brasil ao se falar de esporte e acabei respondendo quanto é a grandeza desse País maltratado por uma cultura diminuta quando se pensa em formação esportiva de qualidade. Na minha cabeça então vieram muitos questionamentos sobre a nossa grandeza:


É difícil pensar em grandeza quando vemos imagens recorrentes assim.
Quantas crianças e jovens não conseguem se desenvolver por falta de oportunidades, de praças esportivas com estrutura, porque na região em que vivem não existe continuidade para a modalidade que pratica e se interessa, ou sequer existe um trabalho de formação por lá? Quantas têm de ajudar no sustento da família desde cedo e têm de abrir mão de se divertir e aprender uma modalidade, para ter de trabalhar desde cedo, interrompendo uma infância e juventude que provavelmente não aparecerá mais?




Quantos professores/técnicos e formadores de equipes de base no Brasil pregam que um atleta não leva jeito, que já tem 15 anos(ainda tem 15 anos) e não aprenderá mais ou não tem "cacoete" para a modalidade, sem se importar com o desenvolvimento amplo, a longo prazo, ou com o próprio desejo do atleta em aprender mais e se tornar melhor? Quantos gostam de trabalhar apenas com o atletas "prontos"?

Quantos atletas deixam de treinar mais ou se desenvolver melhor porque são envolvidos por um discurso de que são talentosos e acabam criando um ambiente acomodador por família, técnicos e amigos, criando a imagem de que já são craques, já brilham e que agora podem curtir privilégios e o status de "estrela"? Como se os atletas bem sucedidos tivessem um momento em que parassem de treinar e se dedicarem ao esporte que praticam e de forma mágica continuassem no mais alto nível. 

Quantas escolas no Brasil têm uma Educação Física de qualidade, onde se explora o desenvolvimento motor, aliado às construções pessoais, afetivas, sociais e que ainda conseguem trabalhar o esporte como conteúdo, mas que consegue ir além, tratando das mais diversas possibilidades da área, legitimando o trabalho de Educação Física como uma disciplina formadora para a vida, desenvolvendo saúde, bem estar,  boa formação motora, auto-conhecimento e senso crítico? (Tema para futuros posts)

Quantos técnicos ditos de alto rendimento pedem para seus atletas talentosos ainda na base largarem a escola para fazer supletivo, pois no Brasil, se quiser ser um jogador de alto nível, não há tempo para estudar e é preciso treinar mais que os outros? (Acredite, existe muito isso! Infelizmente.) 

Quantos esportes são diminuídos em sua importância, pois somos o País do futebol? Esportes como o Handebol, que é um dos mais praticados nas escolas do Brasil, que teve sua melhor participação da história nas Olimpíadas de Londres 2012 com o Handebol Feminino e que ao perder para a Noruega (Que no fim das contas foi a campeã) foi tratada por meios de comunicação como "amarelonas", por ter perdido de virada nos minutos finais, como se o esporte não pudesse ter revés quando o derrotado somos nós?

Alexandra recebe a premiação de melhor jogadora de handebol do mundo.
Quantas Alê's (Ainda falando de Handebol, a brasileira Alexandra Nascimento foi considerada a melhor jogadora do mundo da modalidade agora em janeiro. Você ouviu falar disso nos noticiários? E se fosse o Neymar?) espalhadas pelo Brasil não terão a sua chance de se desenvolverem, pois nem sempre há um ginásio "remendado"e mal tratado com um professor abnegado tentando ajudar para dar oportunidades a estas atletas?


Quanto tempo esperaremos pelos próximos campeões solitários? Quantos Gugas, Diegos e Danieles (Hypolito), Arthurs (Zanetti), Daianes, Natálias (Falavigna), Sarahs (Menezes) e outros tantos atletas que despontaram mundialmente parecendo mágica, terão de carregar o peso de nossa não grandeza(seria pequenez?) no que diz respeito a formação no esporte?

Quantos que despontarão no esporte representando nosso País e não serão o primeiro ou melhor do mundo, terão um tratamento menor, como se tivessem fracassado em sua trajetória? Quantos sequer aparecerão nesse meio do caminho por falta de apoio já que não disputam o primeiro lugar?

Quantas vezes ainda nos emocionaremos e sentiremos o orgulho de ser Brasileiro ao vermos notícias de atletas indo a pé a treinamentos, treinando descalços por falta de condições, ou tendo no seu professor de Educação Física abnegado a única fonte de renda para treinar e se alimentar, ao invés de nos envergonharmos de sermos um País com tanta injustiça social e sem estrutura assim para formar pessoas para o esporte e para a vida?

Quantos espaços esportivos continuam se deteriorando? Quantas quadras construídas e usadas pra propaganda de políticos estão largadas e viraram espaço de usuários de drogas? Onde os atletas de atletismo do Rio de Janeiro irão treinar após a interdição para demolição do Estádio Célio de Barros, que vai virar estacionamento para a Copa do Mundo (É nossa!!!) 2014?

Quantos atletas foram beneficiados com o legado do Pan 2007 e quantos serão com o legado da Olimpíada 2016? Onde está este legado se os jovens não têm acesso aos centros esportivos, seja por localização, seja por falta de projetos sociais?



Quantos milhões estão sendo destinados ao esporte adulto com o discurso de que o foco no Brasil é estar entre os melhores em 2016 e para isso precisamos alavancar o esporte profissional? Quanto tempo ainda levaremos pra entender que formação esportiva leva tempo e não leva o tempo de um mandato de governo? Quantas gerações ainda serão desperdiçadas no momento em que ainda estamos olhando pra ponta ao invés de focarmos na formação, na educação, na base?


Texto que foi eternizado neste vídeo. Escrito em 2008,  está mais atual do que nunca. 


Quem lê o que escrevo nesse post e não me conhece pode até pensar que desisti do esporte e que não acredito em um futuro melhor. Mas é exatamente ao contrário. Preferi falar de nossa pequenez ao invés da grandeza, pra mostrar o quanto somos fortes mesmo com todas essas situações que as vezes parecem desencorajadoras.

E se temos algum nome mundialmente, se temos bons trabalhos espalhados pelo País (mesmo que muitas vezes "escondido") é porque temos profissionais que não desistem de fazer um bom trabalho, que amam o que fazem e que ainda acumulam energia suficiente para seguir em frente. Assim como temos um povo batalhador, que chega em casa tarde e acorda cedo para se dedicar, trabalhar duro e tentar "ser alguém", apesar de muitas vezes as situações e os "ventos" não estarem muito a favor. É por isso que ainda temos grandes nomes e grandes talentos. Porque somos grandes, porque nossa grandeza está dentro de nós, mas não está (infelizmente) ainda em nossa estrutura, em quem pensa o esporte no Brasil, em boa parte dos nossos gestores.

Me incomodo bastante com a forma "florida" que muitas vezes falamos do esporte no Brasil como se tudo estivesse bem. E este desabafo, proporcionado por um simples vídeo de um minuto de duração deverá ser a tônica do blog neste ano. Quero postar mostrando que temos falhas, que precisamos melhorar, e claro, sugerindo propostas de mudanças. Pensar em formação de qualidade não envolve apenas esporte, envolve economia, repasse de verbas a quem e onde precisa, projetos esportivos associados a urbanos e vinculados a projetos de saúde, um bom entendimento do que é formar bem por parte da mídia, plano de formação de bons professores com bons currículos e não currículos enxutos que formam com rapidez futuros professores sem base. Enfim, é muito mais do que aparece apenas nos noticiários esportivos da hora do almoço.

Nossa grandeza precisa aparecer em várias frentes, pois senão seremos pequenos com dimensão geográfica enorme e com discurso distorcido da realidade. Entre o que aparece na tv e o que acontece no dia a dia há um abismo enorme.

A grandeza de muitos atletas fez com que eles superassem muitas adversidades que acontecem com quem tenta ser atleta profissional no Brasil e nos encheu de orgulho nos representando ao longo dos anos em diversos esportes. Mas muitos mesmo tendo essa grandeza dentro de si, não conseguiram superar muitos dos obstáculos aqui citados e sucumbiram no meio do caminho, tornando-se "pessoas comuns", seguindo suas vidas sem a chance de tentar realizar seus sonhos. Esses não aparecem nas estatísticas, estão escondidos no meio de tantos outros brasileiros e essa é a prova de que não basta grandeza interior para desenvolver-se. É necessário estrutura, apoio e formação de qualidade. Ainda nos falta esses três pilares para sermos grandes.

Que 2013 possa ser um ano de crescimento para todos nós em busca de sermos maiores em diversos quesitos, principalmente no que diz ao nosso interior, à nossa base e não apenas da boca pra fora.

Abraço a todos!

segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

Fora do eixo.. até quando?

Nessa época do ano normalmente vivemos de retrospectivas. Passamos os últimos dias do ano sem muitas emoções ou vivências marcantes. Tiramos os últimos dias para refletir o que fizemos, avaliamos e planejamos o ano seguinte. Era pra ser assim o meu fim de ano também, mas uma competição, confirmada em cima da hora, mexeu com meus planos de férias e me deu os ensinamentos mais marcantes logo no final do ano. Ensinamentos que já martelavam a minha cabeça e que ontem, ao final da competição, me fizeram ter a certeza de que precisamos continuar trabalhando duro.

Estou falando do NBB Sub-22, onde Brasília foi uma das sedes e que contou com a participação de 9 equipes, que divididas em dois grupos,  disputaram 4 vagas para para a próxima fase da competição.



Estive ali para acompanhar a equipe de Brasília. Equipe essa que já tive o prazer de acompanhar de perto muitos dos meninos que lá defendem o nome do Basquetebol da cidade. E é sobre esse tema que a competição me deu uma série de ensinamentos. Vou tentar descrever sobre essas aprendizagens que muitas vezes só o esporte consegue proporcionar de maneira tão emocionante.

Nasci no Rio de Janeiro, sou carioca com um orgulho tremendo, mas foi Brasília que me criou. Foi Brasília que me tornou homem e me fez apaixonar-me pela modalidade de Basquetebol. Crescer em Brasília e decidir trabalhar com Basquete aqui,  fora do eixo Rio-São Paulo, me fez aprender desde cedo que nem sempre estaremos sendo vistos ou avaliados como realmente merecemos. E não faço dessa fala um discurso de sofrimento ou vitimização. É justamente estar fora do eixo, fora do centro das atenções, ou fora do "mercado principal" do Basquete que me motivou a trabalhar com essa modalidade com mais força e vontade. Aqui em Brasília sempre foi feito um trabalho de qualidade, com pessoas envolvidas, estudadas e que querem o crescimento da modalidade em geral. Mas não fazer parte do "eixo principal" da modalidade é aprender que não deve se chatear com o que dizem, pensam, escrevem, falam ou deixam de falar sobre o trabalho em sua cidade.

E em uma cidade como é Brasília hoje em dia, com a equipe atual Tricampeã do NBB, a imagem que se tem é que temos o melhor time porque apenas contratamos alguns dos melhores jogadores do Brasil para compor a equipe. Concordo em parte com isso, principalmente quando vejo que em 10 anos de equipe em Brasília, quase não se lançou ou projetou um jogador dentro da própria cidade. Os meninos até hoje continuam tendo de sonhar em sair da cidade para receber uma real oportunidade de despontar na modalidade. Mas toda essa questão não diminui o trabalho que é feito na cidade. 


UNICEUB-BRB - Atual Tricampeão do NBB

Brasília no ano passado ficou com o 4º lugar no NBB Sub-22 e não era cotado para estar entre os 4 melhores. Mais uma vez em 2012 não citaram a equipe de Brasília entre os favoritos ou candidatos à estar entre os melhores. E fico me perguntando o porquê disso. Sinceramente acredito que fazem isso por dois motivos: O primeiro é que não conhecem realmente o trabalho aqui realizado. Como estamos fora do eixo sempre somos vistos como surpresas e não como realidade. Isso acontece mesmo, não dá pra acompanhar de perto todos os trabalhos.  E o segundo motivo é o que mais me preocupa. Na minha visão, vemos o esporte de forma reduzida e superficial. Conta-se o número de "estrelas" nas equipes e dá-se um somatório para avaliar se a equipe é boa ou não. Isso é uma distorção muito comum vindo do nosso querido futebol. Uma cultura que espalhamos para as outras modalidades. Não avaliamos trabalhos, processos e desenvolvimento. Avaliamos cestinhas, artilheiros e número de pontos. E quando alguém surge fora do prognóstico, tratamos como surpresa e não como fruto de trabalho árduo de longo tempo.

Assim vejo que aconteceu com os meninos Sub-22 de Brasília. Associados ao nome da equipe estavam os nomes Ronald e Isaac. Dois talentos da equipe que ajudaram e muito o resultado espetacular que esta equipe conquistou na tarde de ontem. Mas estamos falando de um esporte coletivo. E nessa equipe, os nomes vão muito além de Isaac e Ronald. Os nomes passam por garotos que treinam duro diariamente,que sonham com o esporte pra vida deles (mesmo com a triste realidade do esporte não ser tão profissional assim no Brasil), que fazem faculdade, treinam, ajudam suas famílias e a cada dia tentam se tornar mais equipe. Ronald e Isaac estamparam todas as notícias após a contundente vitória sobre Franca na tarde de ontem, garantindo o primeiro lugar de seu grupo, mesmo com declarações de técnicos de outras equipes que já davam o primeiro lugar para a equipe de Franca. Ontem eu vi um super jogo de Basquete. Vi uma equipe superando seus limites, uma equipe que praticamente não jogou o ano inteiro esperando essa competição, uma equipe que não tem um campeonato de base para se desenvolver na cidade enfrentando outra super equipe, campeã Paulista Sub-19 e que tem um trabalho fantástico.  Mas queria vir aqui postar para dizer que o time de Brasília não se chamava apenas Ronald e Isaac. Esse time também se chamava João, Gabriel, Vitor, Raphael, Matheus, Lucas, Guilherme, Luiz, André, Tchiêlo, Paulo, Jefferson, Breno e outros nomes mais.. Um time inteiro que se chamava David na camisa. Uma equipe que só ela sabe o que passou nesse ano ao perder um colega de quadra, dentro de quadra.

E aí novamente me pergunto: Até quando vamos ficar quase que individualizando um esporte que tem em sua essência a coletividade? Me incomodei por demais com a maneira que a equipe foi tratada. Nos bastidores a conversa de que Brasília venceu os jogos apertados e, portanto, não teria chances contra a equipe de Franca, que vencera seus jogos por diferenças de pelo menos 30 pontos. Isso não quer dizer nada (ou diz muito pouco) em uma modalidade que tem como tônica a coletividade e a capacidade de superação das equipes. O talento de Ronald e Isaac foram muito bem fomentados por uma equipe de jovens atletas que merecem respeito e admiração, mesmo não estando treinando em clubes ou equipes mais conhecidas no Brasil. Enquanto tratarmos o esporte como mágica, a formação como apenas rendimento dentro de quadra e resultados em apenas números, seremos um País com dificuldade de formar.

Ontem os meninos de Brasília deixaram uma lição escrita dentro de quadra. Não há como saber quem vencerá antes. O esporte é bonito porque é dentro dele que acontecem as decisões mais importantes. Enquanto existe tempo de jogo, existe a chance de se alterar o resultado. Mas no País em que vivemos de individualizar o esporte coletivo, temos ainda muita dificuldade de enxergar isso. Como disse antes, ontem vi um super jogo. Vi a equipe de Brasília jogando uma partida que ainda não haviam feito esse ano (Sei do que falo, pois acompanho esses meninos) e vi uma equipe de Franca tentando de todos os modos reverter o resultado. O que quase aconteceu no final da partida e que se acontecesse, seria recheada de méritos para a equipe Francana por nunca ter desistido de reverter o resultado.




Esse pra mim é o fascinante do esporte. A imprevisibilidade que assusta, mas que ao mesmo tempo gera uma chance de te fazer melhor e que te dá uma chance de se superar.  Mas enquanto vivermos de pragmatismos, de nomes, de preferidos antes da hora, estaremos simplesmente jogando fora a boa formação no Brasil. Ontem quem ganhou foi o Basquete, mas ainda temos a incrível mania de escolher heróis e vilões. Exaltar em excesso o vitorioso e rebaixar o derrotado.

Se falo isso estando em Brasília, um lugar que está fora do "eixo principal"(é o que dizem), mas não tão distante, imaginem quantos trabalhos fantásticos devem existir no Norte, Nordeste e outros locais que não acompanhamos. E por não sabermos, muitas vezes tratamos como um trabalho não tão bom ou efetivo assim. Esse é o País que quer sediar Olimpíada, que quer ser referência no esporte mundial. Um País que sequer sabe explorar tudo o que tem em si. Estamos distantes, muito distantes ainda.

Por isso agradeço a lição dada pelos meninos de Brasília ontem a tarde. Ver estes meninos jogando com a intensidade que jogaram (Logo eu que tanto já critiquei a intensidade deles!) me dá a certeza que devo continuar trabalhando duramente pela formação de novos esportistas. Esportistas da quadra, esportistas para a vida, mas que acima de tudo, não devem nada a ninguém em lugar algum.

Parabéns aos comandantes Laurindo Miura, Michael Rossi e Ronaldo Pacheco pelo trabalho de excelência que fizeram com estes garotos. Nós sempre soubemos que o trabalho de vocês dava resultados muito além, mas dessa vez o resultado também teve sua expressão em resultados.

Eu não queria estar na pele de vocês. Na próxima fase estarão sendo visados. Qualquer boa atuação não será mais surpresa e caso joguem mal terão "fracassado", segundo "especialistas". Será muito mais complicado passar para a próxima fase e repetir a colocação entre os 4 melhores como no ano anterior. Só o que posso desejar é que continuem trabalhando duro para continuarem tentando dar lições dentro de quadra. Fora dela essa equipe já me ensinou demais.

Brasília Sub-22: Se superando dentro de quadra e dando lição para fora dela.




Certa vez li uma frase do Dalai Lama que dizia: "Quando perder, não perca a lição."

Essa equipe foi além, me fez aprender com as vitórias. Vitórias de uma EQUIPE. Eles sabem do que falo.


Que em 2013 possamos cada vez mais abrir as portas do esporte para quem se interessa em trabalhar duro, de forma digna, honesta, mas acima de tudo com qualidade!

Um excelente 2013 a todos!

segunda-feira, 15 de outubro de 2012

Ser professor não é apenas dar aula.


Foi a paixão pelo esporte que me levou a ser quem sou. Desde garoto já vendo que não tinha tantas habilidades assim, sonhava em ser técnico esportivo. E queria ser dos melhores, sonhava estar na seleção, em participar de programas de tv dando entrevistas e de ser reconhecido nacionalmente. Ao entrar na universidade pra estudar Educação Física, comecei a descobrir que o caminho não era tão único assim. Comecei a descobrir que para atuar na área do treinamento era preciso dominar a área do ensino. E não bastava estudar os movimentos, o corpo humano e entender do quanto de treino é necessário para desenvolver as habilidades. Era preciso dedicar-se a entender de pessoas, de comportamentos e das mais diversas situações em diversos contextos. E aí comecei a aprender o que, na minha opinião, é o mais fascinante e desafiador na docência: Aprender a conhecer-se.

E assim,  montando meus treinos e aulas, fui me baseando nos grandes mestres que tive (nas salas e nas quadras), nas leituras e aprendizados que ia tendo na faculdade  e também de olho em não cometer os mesmos vícios de comportamento de professores que me fizeram quase desistir da profissão (eles me ajudaram a eu saber como não queria ser).


Era uma vez uma escola que tentava ensinar conhecimento e felicidade juntos.


Mas tudo começou a mudar mesmo quando entrei em sala de aula. Desde meus estágios nas escolas, até a entrada oficial como professor titular, comecei a perceber que ser professor era entender o outro e a conhecer cada vez mais seus próprios potenciais e seus limites. E saber trabalhar isso em poucos minutos semanais com uma turma acabou me dando uma vivência que passava por uma linha tênue entre a loucura e a plena satisfação. Na Educação Física então, a disciplina que "não reprova", que só serve para "passar o tempo" e pra dar uma "relaxada", era preciso encantar a cada aula, mas também deixar claro que se tratava de uma disciplina como qualquer outra, que forma, que ensina e que pode deixar algo que vai além de práticas motoras. 


Vivendo intensamente a escola, você passa a conhecer um mundo de diversidades de alunos, de realidades e a conhecer os mais diversos professores, que dividem contigo o mesmo ofício e que muitas vezes vivem realidades diferentes da sua e que têm metodologias próprias. E você nota que começa a virar uma coletânea de cada um. Começa a ser influenciado por um, divide as angústias com outros e as vezes entra em conflito com alguns. Mas acima de tudo, você começa a aprender que o que se pensa de escola hoje em dia é absurdo. A responsabilidade jogada nas costas dos professores, na formação e educação de crianças e jovens é completamente surreal. Num mundo onde as escolas viraram muitas vezes "depósitos de alunos", onde a família cada vez mais se distancia da construção da educação de seus filhos e os professores não são prioridades em um governo sequer, descobre-se um mundo obscuro de sofrimento, cobranças externas e internas, e você se depara com pessoas incríveis, cansadas, extenuadas e até arrependidas pela profissão que escolheram. E ao mesmo tempo você se depara com professores que conseguem mesmo diante dessa realidade, serem fortes, fazerem a diferença e te darem a certeza de que é esse caminho que você quer seguir. 



E foram esses que mudaram drasticamente a minha profissão. Foi vendo professores assim que descobri que eu não posso apenas entender de movimento e treinamento. Foi me deparando com esses "eternos inconformados" que descobri que era preciso entender em que sociedade estamos, que era necessário entender a cultura em que vivemos para poder atuar, que era preciso entender pontos de vistas diferentes, tomando decisões a partir delas, compreendendo cada lado, cada situação. Era preciso saber de história, de como somos e fomos influenciados e como nossa história nos faz ser o que atualmente somos. Era preciso saber em que mundo vivemos, de política, do que fomos, o que somos e o que queremos ser. Era preciso entender a geopolítica para dar contexto crítico ao que se recebe de informação, principalmente vinda da tv. Aprendi também que precisava me expressar bem(e quantos erros cometo até hoje, meu Deus!), falando ou escrevendo, pois uma informação confusa pode gerar um conflito em diversos alunos por um bom tempo. A mensagem precisa ser clara, direta e que desperte de alguma forma no aluno a capacidade de querer saber mais, de repensar seus atos ou o que se viveu ali em aula. Além disso, precisava estar antenado em outras línguas, no que acontece de informação pelo mundo afora e estar pronto para aprender sobre isso. Era preciso ter um raciocínio lógico, ou criar um despertar a isso. Em diversas situações na vida precisamos de uma mente clara, aberta para receber as informações e para "calcular" o impacto de nossos atos, então descobri a matematizar a vida, e a explorar nos alunos a capacidade de trabalhar de forma lógica a interpretação dos fatos. E nesse caminho aprendi que vivemos de física muito além de fórmulas. Somos física pura desde que nascemos, aprendemos a andar e praticamos física a cada momento. Junto a isso, associamos a química na interpretação dos diversos elementos que a vida nos oferece e precisamos entender o que há de vida em nós e a nossa volta. Entender como funcionamos, quem somos, como nos desenvolvemos e o que há de riqueza de vida à nossa volta. Por fim.. aprendendo sobre toda essa diversidade que uma escola pôde me oferecer, aprendi que tudo o que fazemos, tudo o que produzimos é uma forma de arte. A arte não está nos grandes museus apenas e sim, em nossa existência, em nossos pensamentos, ideias e produções. 

Foi a escola que me devolveu aos treinamentos de outra forma. Que me levou a ter a plena certeza de que o trabalho com o  treinamento esportivo, seja na iniciação ou no alto rendimento, é uma forma e um ato de educação. Infelizmente não é isso que vejo muitas vezes por aí na minha área. Por diversas vezes vejo treinadores se "esgoelando", gritando e destratando seus alunos em busca de uma vitória, pais ensinando aos filhos que o adversário é um inimigo e muitos tentando mostrar que o importante é vencer, a qualquer custo ou a qualquer preço e em qualquer idade, esquecendo-se das fases de desenvolvimento de cada um. Mas mesmo assim, mesmo com os desvios que existem não só na docência como em todas as áreas, venho aqui lembrar deles. Dos professores que mudaram minha vida, dos técnicos que me ensinaram um esporte que não existe por aí, muito menos na tv. De professores na sala de aula que me ensinaram equações erradas de propósito, só me mostrando que estava errada quando eu tive a coragem de ir questionar. Foram esses que me tornaram crítico(tudo bem que fiquei crítico demais), que me fizeram pensar ao invés de decorar, que me fizeram apaixonar-me ao invés de baixar a cabeça e copiar. Foi com diversos destes que tive o prazer de dar aula junto, de participar de conselhos de classe, de reuniões pedagógicas e não demagógicas e são estes que me fazem vir aqui e agradecer pela inspiração. Pelo orgulho que me dão em pensar que no dia de hoje temos mesmo de nos parabenizar, mesmo com a realidade de um Brasil que não investe como deveria em educação.

Atuo nesta área porque acredito na mudança, porque acredito que podemos influenciar pessoas e ajudar a formar tantas pessoas muito melhores que nós. Mas principalmente porque não apenas acredito, mas tenho provas de que sou muito melhor do que era como pessoa por tornar-me professor. Enquanto muitos ainda são "dadores de aula", eu prefiro ficar com os que conseguem nos minutos que tem, dividir suas ideias e gerar uma reflexão em seus alunos para um aprendizado de qualidade. 

Fica aqui os parabéns a todos que dividem essa luta com seriedade, amor e não como um passatempo de quem queria ser alguma coisa "famosa", não conseguiu e tornou-se professor. E fica aqui um agradecimento especial a diversos professores que me fizeram parte da minha trajetória e com quem atuei diretamente tentando propor uma educação as vezes utópica e que a vida nos fez seguir caminhos em instituições diferentes. 

Ah.. e quanto ao sonho da fama e das entrevistas na tv, o trabalho me mostrou que ser bem sucedido vai muito, mas muito além disso e os alunos que por mim passaram me mostraram que nosso valor está no dia a dia e não em um reconhecimento efêmero televisivo.

Parabéns a todos os professores comprometidos com formação de qualidade e o trabalho duro!





sábado, 1 de setembro de 2012

1º de Setembro. Dia de perguntar: Você está fazendo a sua parte?

Hoje é o dia do profissional de Educação Física. Como já disse outras vezes aqui no blog, é um dia normal como qualquer outro. Considero de verdade o dia 15 de outubro (Dia do Professor), mas não sou rebelde ao ponto de não aceitar os parabéns pelo dia de hoje ou qualquer tipo de felicitação. Aceito e sempre tento aproveitar pra poder falar sobre o tema e a profissão. 

Como também já disse por aqui. A criação desta data é uma estratégia do conselho nacional de educação física e seus conselhos regionais para se legitimar no mercado. Eu sinceramente tenho minhas críticas ao conselho. Não sou contra a legitimação da profissão por meio de um conselho, desde que este vise investir na profissão com uma formação continuada e uma busca por melhor qualidade de aula para estes professores. Mas não é isso que acontece. Tenho de pagar mais de quatrocentos reais por ano ao conselho pra apenas dizer ao mundo que eu sou professor de educação física. Para isso tenho o meu diploma, estudei pra me tornar professor e não precisaria de um órgão pra dizer isso por mim. Sabemos muito bem o histórico do conselho (sei bem pelo menos da região centro-oeste) e por muitas vezes o conselho teve atuações muito mais visando lucro do que com o ideal de fortalecer a categoria de profissionais. Tenho amigos que trabalham lá dentro, sei que tem gente séria, mas sinceramente não acredito no ideal do conselho e sua atuação. Vem eleição por aí e torço pra que possam dar uma direção diferente a essa realidade.


Mas não era sobre isso que eu queria vir falar aqui. Na verdade eu queria dizer que enquanto muitos vibram, festejam, gastam com propagandas na tv parabenizando os profissionais de educação física, eu aproveito a data pra perguntar: 

Estamos fazendo a nossa parte? 

Sinceramente eu tenho dúvidas sobre a resposta.

Recentemente vi casos absurdos de atuações profissionais e fico me questionando o caminho que estamos tomando na profissão e principalmente na formação de novos professores. Vou contar alguns casos pra vocês.

Fui convidado pra dar uma aula em uma disciplina do ensino superior do curso de educação física e lá o professor é bastante envolvido e gosta de trabalhar com os alunos não apenas no formato prático, mas com textos e leitura de artigos também. Ele diz que é um investimento em seus alunos e uma tentativa de torná-los mais críticos. Mas ao final dessa aula na qual participei, saindo da aula eu ouvi o "desabafo" de um dos alunos para um colega: 

"Esse professor viaja demais, ele acha que só temos a matéria dele para fazer. Não bastasse a aula ele ainda quer que façamos resenhas de artigos."

É isso mesmo que você entendeu. O aluno estava chateado porque tinha de estudar. Meu questionamento imediato ali comigo mesmo foi: Aquele desabafo era uma distorção, um ato isolado, ou é uma máxima da educação física? Não temos de ler? Como seria esse aluno então fazendo medicina? Achei absurdo e sintomático essa declaração.

Outro professor universitário assumiu ano passado a cadeira da disciplina de basquete(Graças ao bom Pai ele não está mais a frente dessa disciplina). Há muitos anos ele não lecionava essa disciplina e simplesmente não se preparou pra ela. Veio com conceitos antigos ensinar os alunos e sempre que questionado que a aula era muito "vaga" com conceitos muito superficiais, ele discursava dizendo que trabalha num estilo democrático, onde os alunos aprendiam sob descoberta orientada. Resumindo: Ele usou de alguns conceitos de estilos de ensino para explicar sua falta de estudo. Mas ele foi além. Ao ensinar o movimento da bandeja para os alunos universitários, ele simplesmente ensinou com os alunos tendo de pular bolas para aprender a fazer as passadas. Esse modelo não é mais utilizado acredito que pelo menos a uns trinta anos. Além de antigo e não eficaz, ele é perigoso, pois o aluno pode pisar na bola, cair e se machucar. E infelizmente foi isso que aconteceu. Uma aluna pisou na bola literalmente, torceu o tornozelo e rompeu ligamentos do mesmo. Esse foi o ensinamento de um professor "conceituado" no mercado. Isso era o que ele passava para os futuros professores de educação física.

Tem muito professor parecido com o personagem Rolando Lero


Em outra universidade, um professor é famoso por no dia de quarta-feira, que ele teria de dar aula até às 22h40 na universidade, liberar os alunos mais cedo (por volta de 21h30) porque quarta-feira é dia de futebol na tv! Vocês acreditam nisso? Uma vez por semana ele negligencia 100 minutos de sua aula (imagina esse somatório em um semestre). E os alunos o que fazem? ADORAM! 

"Esse professor é massa, entende o nosso lado." 


Foi isso que já ouvi dizer sobre ele.

Outro professor (essa caso é clássico) coloca um estagiário/monitor/amigo/ algo que o valha para dar aula em seu lugar. Ele é um professor doutor e tem muitos afazeres. Pouco aparece na sala, não acompanha a evolução dos alunos e no fim, diz que está investindo na formação de um novo professor. Eu não tenho nada  contra o professor que investe em um monitor para dar algumas aulas. Mas sou contra o professor que simplesmente se omite do seu ofício para pegar esse horário e trabalhar em outras coisas. É isso que acontece demais. E os alunos? Precisam fazer a matéria, muitas vezes o estagiário não tem tanta competência ou poder para avaliá-lo, então a matéria torna-se mais "fácil de passar", então está tudo certo.

Por fim, esse é o mais curioso. Um professor que passa no início de semestre textos em espanhol, pois dessa forma muitos alunos vão levar mais tempo lendo e assim "gastarão" mais tempo de aula e ele não precisará dar nada de matéria. Nada contra quem passa texto em língua estrangeira, desde que este seja um ato com intencionalidade pedagógica. Esse na minha visão se parece com aquele professor de escola que quando vê que em sua aula em quadra aberta, o tempo começa a nublar e fechar, ele já fala pra turma que pra segurança de todos os alunos não vai ter aula porque está com perigo de chover e de ter raios. Leva eles pra sala,deixa eles batendo papo(Já que, segundo estes, não há o que ministrar de aula de educação física em sala). Acreditem, isso existe muito. 

E por que contei todas essas histórias? Por que em praticamente em todos esses casos, o que os alunos fizeram para protestar? No caso das universidades, todo fim de semestre os alunos necessitam fazer uma avaliação de cada professor. Ali eles têm a chance de mostrar um pouco da realidade. Mas devido a um pacto da mediocridade absurdo e quase que cultural brasileiro, em muitos lugares os alunos colocam avaliações positivas sobre todos os professores. E pronto, o ciclo da mediocridade está a pleno vapor.

Recentemente tivemos o sucesso nacional da aluna Isadora Faber (clique aqui pra saber sobre esse caso) que começou a mostrar na internet os problemas de sua escola e que nos colocou essa questão no ar: 

Isadora Faber e seu Diário de Classe


O que estamos fazendo para exigir aulas e profissionais de qualidade?


Hoje não tirei o dia pra comemorar. Tirei o dia para desabafar sobre essa realidade que continua reforçando que o professor de educação física é um cara carismático (ser só isso é muito pouco), que é criativo (já que nas escolas não há material adequado pra dar aula e o professor precisa improvisar) e que não estuda constantemente. Essa é sim, ainda uma realidade comum em nosso meio. E pior, reforçada e legitimada por diversos professores, mestres e doutores que estão na universidade, "fugindo" de dar aula de verdade. Seja mais crítico em seu olhar e você verá, eles estão por aí tomando conta ainda de muitos espaços.

Mas não pense que eu vim aqui fazer um post pessimista e determinista desse jeito. Eu falo tudo isso porque me indigno mesmo com quem toma espaço de bons profissionais apenas por títulos e nome, mas acredito muito no surgimento de bons profissionais. Hoje em dia tenho o prazer extremo de trabalhar cercado de bons profissionais e vejo estudantes de educação física já muito mais críticos ao que recebem de informação. Há dois meses atrás, participei de um curso de capacitação para professores da rede de ensino do DF que trabalham com treinamento esportivo nas equipes escolares. Fui receoso, com medo de que eles estariam fechados em seus mundos restritos a novas informações. E o que vi foi um grupo de professores (em torno de 70) muito afim de aprender. Sim! Essa é a palavra. Alguns com mais de 20 anos atuando como professor e simplesmente ávidos por aprendizado, informação e pela chance de tornar suas aulas mais dignas e capacitadas.

Nesta quinta-feira estive com eles novamente e falei o que escrevo aqui agora. Tê-los conhecido e vivido esse curso com eles, mexeu diretamente com meu trabalho. Me tornou mais crítico, mais responsável com minha profissão, mas me deixou mais esperançoso de que podemos sim fazer um trabalho de maior qualidade. Existe muita gente boa por aí, o que precisamos é sermos críticos e diretos com aqueles que tentam reforçar que Educação Física é uma disciplina divertida e feliz. Educação Física é muito mais que isso. Ela também é trabalho árduo, esforço e estudo diário, mas pra quem gosta e vê sentido no que faz, tem um retorno incrível quando vemos que podemos influenciar e alterar de maneira positiva o cotidiano das pessoas.

É nesse misto de revolta com o que temos por aí e esperança e confiança naqueles que fazem valer a pena essa profissão que eu pergunto: 

Você está fazendo a sua parte? 


Espero que sim e que continuemos fazendo para termos um dia o que comemorar de verdade.

Parabéns professores e estudantes de Educação Física.

Ofereçam e exijam aulas de qualidade baseada no estudo e não na amizade e no bom papo.

Abraço a todos.